Um dia na vida da pequena Helena
#116 Em seus sonhos, ela ouvia os doces mistérios dos sons coloridos.
Novo Oeste, 14 de outubro de 2022.
UM DIA NA VIDA DA PEQUENA HELENA
Com os pés descalços e uma varinha seca, Helena, a surdinha de Novo Oeste, passava os dias rabiscando o chão de terra da cidade onde nascera.
Surda para o mundo, invisível para tantos outros, ela desenhava pela manhã para ir conferir à tarde; desenhava à tarde para ver à noitinha, e pela noitinha para conseguir sonhar.
Em seus sonhos, ela ouvia os doces mistérios dos sons coloridos. Nas noites ruins, empapada em suor, enxergava o medo causado por intermináveis procissões de olhos brancos.
Na ronda de seus dias, ao longo de seus caminhos de volta, sorria para os desenhos preservados, retocava as obras mexidas pelo vento e assinava seus pés na lama quando chovia.
Quando mãos humanas estragavam seus traços, assustada, Helena fugia. Ia abraçar o Tio Preto, seu vizinho – seu João –, o pintor de paredes da cidade.
Agitada, a pequena Helena tentava explicar a maldade e sentia a mão forte que passava em sua cabeça. Depois, acolhida, apaziguada, com olhar baixo e respiração voltando ao normal, aceitava o carvão e ia desenhar na última parede a ser pintada na jornada de trabalho do seu João.
Mais tarde, voltavam para casa.
Vitor Bertini
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Durante a próxima semana, em edição extraordinária, tudo sobre o Substack - essa estranha plataforma onde habitam as histórias da sexta;
A ilustração de hoje é do artista tcheco, Alphonse Mucha.